O PUGILISTA

Apesar de quase um ano de atraso, devido a problemas diversos de financiamento e conflitos entre os produtores, a divisão cinematográfica da Amazon apresenta-nos um drama histórico acerca da vida e carreira do pugilista Inglês James Belcher. Passado entre o final do século XVIII e o princípio do século XIX, “O Pugilista” retrata uma era mais violenta e menos regrada do boxe.

Não obstante a contribuição de Russel Crowe e Ray Winstone, “O Pugilista” tem um elenco predominantemente jovem e algo inexperiente. Mesmo o actor principal, Matt Hookings, que acumula ainda as responsabilidades de escritor e produtor do filme, conta agora com pouco mais de 30 créditos enquanto actor, o que se reflete no seu desempenho, que, sem revelar nenhuma falha óbvia ou crassa, demonstra ainda a sua inexperiência enquanto actor, mas, ao mesmo tempo, grande promessa para o futuro. Contrastando com o cariz nascente da prestação dos actores mais jovens, membros do elenco veteranos do cinema, como sejam Julian Glover ou Marton Csokas, elevam o filme bem para lá do nível de uma produção de novatos. Csokas, em particular, destaca-se no papel do antagonista do filme, com um desempenho repleto de nuance e carisma.

Se Matt Hookings é ainda um actor pouco experiente, é ainda menos experiente enquanto guionista, e o mesmo reflecte-se nos diálogos, que, excepto quando proferidos pelos actores mais celebrados, é um tanto ou quanto ensosso. Uma vez que se trata de um filme passado num período histórico diferente daquele em que vivemos, há uma certa liberdade de transgredir as regras do dialecto, conferida pelo dialecto da era em que o filme decorre; “O Pugilista” nunca abusa desta liberdade, mas, por outro lado, também não tem o tipo de falas memoráveis que consigam evocar todo o filme sozinhas.

Ainda menos experiente que Matt Hookings, tanto enquanto actor como enquanto escritor, é o realizador Daniel Graham, o que se nota na simplicidade e falta de ousadia da realização. No entanto, é preciso salientar que, não obstante a composição simples de cada plano, a realização do filme é mais do que competente; ainda que não tente fazer nada de extraordinário, os planos menos ambiciosos são muito bem conseguidos. Apesar de Graham não se atrever a tentar planos mais arrojados, os planos a que se propõe são muitíssimo bem executados.

Tratando-se de um filme acerca de boxe, são inevitáveis cenas de pugilato, que, para além de impecavelmente coreografadas, são, na sua maioria, fáceis de seguir. Apenas o combate climáctico do filme é filmado de forma mais confusa, mas, graças a lições bem aprendidas do cinema de outras eras (nomeadamente, a prática de dar ao herói um chapéu branco e um chapéu preto ao vilão, oriunda dos filmes Italianos de cowboys), não se torna uma hecatombe de impactos violentos e socos indistintos que podem igualmente atingir um pugilista ou o outro, sem que o espectador se aperceba devidamente de quem esmurrou quem.

A música original do filme é muito subtil, quase impercetível, e muito bem usada para acentuar a intensidade emocional ou dramática de certos momentos. Para além disso, a edição coordena-se muito bem com a música, reservando pausas no diálogo para dar lugar a curtas frases musicais, apenas dois ou três acordes de cada vez que caem no seu lugar como falas de um terceiro participante invisível no diálogo.

Onde o filme brilha, no entanto, é na sua fotografia. “O Pugilista” mostra-nos uma enorme gama de imagens, desde cenas brilhantes no exterior durante o dia às suas contrapartes sombrias durante a noite, repletas de contraste, independentemente da hora a que se passam. As cenas passadas em interiores são, frequentemente, pintadas com uma paleta monocromática, mas mesmo essas imagens são pontuadas por objectos que se destacam vividamente por não serem da cor dominante da cena a que pertencem, evitando saturar o espectador com a tonalidade sobrejacente.

Ironicamente, “O Pugilista” é um drama histórico que dificilmente ficará na história do cinema, mas certamente perdurará como um importante marco histórico na carreira da maior parte dos artistas envolvidos na sua produção.

 

Pedro Polónio.

 



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